terça-feira, 13 de maio de 2008

Um texto de Edmundo Pedro

Edmundo Pedro deveria estar a participar hoje, 13 de Maio, em Berlim, num Forum de Jovens Europeus, dedicado à preservação da Memória Histórica.

Foi para tal convidado a título pessoal, dado o seu passado de resistente, mas não deixaria de sublinhar o seu profundo empenhamento como membro da Associação Movimento Cívico «Não Apaguem a Memória».

Porque uma ligeira gripe o reteve em Lisboa, enviou a comunicação que a seguir transcrevo, dado o interesse que todos terão em conhecê-la.

N. B. - O original foi escrito em francês, eu própria traduzi-o para português.


Ao Forum da juventude europeia, reunido em Berlim, em 13 de Maio de 2008.

Para uma reflexão sobre os problemas ligados à preservação da Memória Histórica.

Meus caros jovens europeus,

Gostaria muito de estar convosco na abertura do vosso Forum que se reveste de uma actualidade e de uma importância fundamentais. Infelizmente, por razões de saúde, não me é possível corresponder ao vosso convite estando presente em Berlim.

No fim da minha longa vida, a participação num iniciativa deste tipo, como membro de uma associação que foi criada, no meu país, precisamente para a preservação da memória da resistência ao regime totalitário de Salazar – que tem o nome de «Não Apaguem a Memória» –, a minha participação na vossa reunião, repito-o, teria representado, para mim, um momento cheio de significado. Teria tido a oportunidade de apresentar um testemunho vivo do que foi, em Portugal, o regime totalitário inspirado pelo nazismo. A repressão não atingiu, no meu país, os aspectos dantescos, quase inconcebíveis, que caracterizaram o regime hitleriano. Mas, apesar disso, conhecemos a experiência concentracionária inspirada pelo modelo nazi, com tudo o que ela representou de humilhação e de degradação da condição humana.

Eu próprio – como tive a oportunidade de contar àqueles de vós que estiveram em Portugal – estive preso num campo de concentração quando tinha dezassete anos. Fui libertado no fim da segunda guerra mundial, com vinte e sete. Se Hitler tivesse ganho a guerra, o mais provável teria sido que eu e os meus companheiros tivéssemos morrido naquele campo de pavor que foi chamado «Campo da morte lenta», onde foram assassinados dezenas de prisioneiros, na sua maioria jovens.

Nessa época, eu era um jovem comunista convencido de que estava ao serviço de um projecto libertador. Enganaram-me. Mas a disposição de me sacrificar até à morte para aceder a um mundo mais livre e mais justo continuou a ser um valor para o Homem, na luta histórica pela dignidade da sua condição. Esta luta nunca termina. Ela é sempre actual. Passa pelo combate contra todos os regimes que não respeitam os Direitos Fundamentais do Homem, contra todos os inimigos da Liberdade – inclusive os que, insidiosamente, mascaram os seus projectos totalitários com aparências libertadoras.

Levar-vos-ia, portanto, meus caros jovens, o testemunho vivo de alguém que partilhou, com outros milhões de seres humanos, por toda a parte na Europa, as consequências do terror nazi que não poupou os países europeus mais ocidentais – esta Europa Comunitária, que hoje partilhamos em conjunto, e na qual não são tolerados regimes totalitários.

O futuro pertence-vos. Sois vós, portanto, caros jovens europeus, que tendes o dever de defender as aquisições sociais e políticas da nossa Comunidade de paz e de progresso, mas também de prosseguir os esforços para os aprofundar e consolidar.

A mensagem que vos dirijo é uma mensagem de esperança no futuro da construção colectiva da nossa comunidade. Mas é também uma mensagem que vos incita a uma vigilância permanente. A Liberdade não é uma aquisição garantida para sempre. É a vós, fundamentalmente, que pertence a tarefa de evitar o regresso a esse passado de horror a que, felizmente, fostes poupados. Sede vigilantes!

Incito-vos, meus caros jovens europeus, a continuar não só a vossa reflexão, mas também a acção concreta contra todas as tentativas de regresso a esse passado de humilhação e de ignomínia que foi o da Europa da minha juventude.

Gostaria muito de conhecer as decisões que vão sair do vosso Forum. Ficar-vos-ei muito grato se mas enviarem.

Para concluir, desejo-vos o maior sucesso para esta iniciativa tão oportuna e importante, ao mesmo tempo que envio as minhas mais calorosas saudações a todos os jovens que participam no Forum para a defesa da Memória histórica.



Edmundo Tavares Pedro

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