segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

O Fundo Santos Simões (guia de fontes sobre a resistência-III)

No âmbito do inquérito que dirigimos aos municípos portugueses sobre a existência de colecções, espólios, fundos arquivísticos ou bibliotecas particulares de resistentes ou opositores à Ditadura Militar e ao Estado Novo, recebemos informação da Câmara Municipal de Guimarães relativa ao fundo Dr. Joaquim António dos Santos Simões.
No Arquivo Municipal Alfredo Pimenta encontra-se em fase de tratamento documental, e ainda inacessível ao público, o fundo Dr. Joaquim António dos Santos Simões, doado pelo próprio. São 21 metros lineares de documentação produzida e/ou acumulada por este resistente antifascista, entre 1927 e 1987.
"Joaquim António dos Santos Simões nasceu a 12 de Agosto de 1923 na vila de Espinhal, concelho de Penela, distrito de Coimbra. Entre 1944 e 1947, já como aluno da Universidade de Coimbra (UC), participou nas movimentações reivindicativas dos estudantes, dedicando-se ainda ao Teatro de Estudantes da UC, onde foi director, encenador e actor. No ano lectivo de 1950/51 acaba por ser eleito presidente da Associação Académica de Coimbra (AAC) e conclui as suas licenciaturas em Ciências Matemáticas e Engenharia Geográfica. Já então se destacava por aquilo que alguns dos seus colaboradores mais próximos designam como um «profundo sentimento de justiça e intervenção social». Depois de leccionar no ensino particular, em 1957 transita para Guimarães onde se torna professor do ensino público na então Escola Industrial e Comercial de Guimarães.
É nesta cidade que Santos Simões começa a intensificar o seu trabalho ligado à cultura, vindo a iniciar, em 1963, uma actividade política organizada, militando na oposição democrática do distrito de Braga. Paralelamente, notabiliza-se como um dos fundadores do Cineclube de Guimarães e do Teatro de Ensaio Raul Brandão, ligado ao Círculo de Arte e Recreio, três instituições onde ocupou cargos e desempenhou um papel importante até à sua morte.
Em 1968 foi preso pela PIDE, vindo a ser expulso do ensino devido à sua militância contra o Estado Novo. Um ano mais tarde, participa no II Congresso da Oposição Democrática, em Aveiro e é candidato da CDE por Braga, na campanha «eleitoral» para a Assembleia Nacional.
No pós-25 de Abril, é reintegrado no ensino oficial, regressando à Escola Industrial e Comercial de Guimarães. Na mesma altura, participa activamente na criação do Partido Movimento Democrático Português (MDP/CDE), integrando os órgãos directivos nacionais e sendo um dos responsáveis pelo partido no distrito de Braga e em Guimarães. Chega a ser indicado pelo MDP/CDE para os cargos de governador civil e de Ministro de Educação, mas foi rejeitado por António Spínola «por ser comunista», segundo descrevem as notas biográficas sobre a sua vida que o próprio deixou escritas.
Participou na criação de novas associações culturais em Guimarães, como a cooperativa editorial O Povo de Guimarães, a Cercigui, e em 1990 é eleito presidente da direcção da Sociedade Martins Sarmento. Faleceu a 23 de Junho de 2004
.
" (História biográfica disponibilizada pelo Arquivo Municipal Alfredo Pimenta).
Âmbito e conteúdo deste fundo documental: actividade política nos períodos da Ditadura Militar e do Estado Novo, abarcando 47 anos de resistência (1927-1974); actividade no e do MDP/CDE (1974-1986); participação, como deputado municipal, durante dez anos (1976-1986), na Assembleia Municipal de Guimarães.
Condições de acesso: inacessível ao público (ainda em fase de tratamento).
Estado de conservação: bom.
Instrumentos de descrição: guias de remessas.
Contactos do Arquivo Municipal Alfredo Pimenta
Endereço: Rua João Lopes Faria, n.º 12.
Tel.: 253 520910.
E-mail: arquivo.municipal@cm-guimaraes.pt
Horário de atendimento ao público: 9-12:30 / 14-17:30h

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

sábado, 22 de dezembro de 2007

Eu vi!

A Albertina Lemos enviou-nos este conto.


Eu vi crianças deitadas em modestos caixões. Eram pequeninas como eu era então. Condiscípulas da mesma escola estilo «Estado Novo», no topo da colina, a igrejinha ao pé. Sentavam-se ao fundo, ou à frente, de salas geladas, em secretárias duras como pedra, os tinteiros nos tampos, um pobre caderno em cima, os pezinhos frios, a cabeça a tombar com o sono, o frio, a fome. Eu via-as depois em féretros de pinho. Morriam com o sarampo, pneumonia, meningite, de qualquer coisa. Ia vê-las com os demais companheiros, e ficava absorto, sem compreender. O que era a morte? Não sabia.Não recordo o funeral do meu irmãozinho, de quatro anos, nem das brincadeiras comuns que ambos seguramente fazíamos. Guardo uma imagem vaga da minha mãe chorando silenciosamente, uma caminha, a dele, nela deitado, não me lembro. Apenas uma sentimento de injustiça e uma ideia nebulosa de justiça.

Vi o meu pai saindo porta fora, provavelmente com lágrimas nos olhos, disseram-me depois que estava preso muito longe, num forte com muros altos, castigado pelo comando da tropa, não soube porquê, mas senti uma profunda revolta, que foi a raiz, e a chama com que incendiei as minhas ideias.


Vi uma mulher, parecia jovem sob os farrapos, caída na rua, debaixo de um fardo de tábuas demasiado pesado para ela. Há quantas horas trabalhava nisso? que comera? Vi que ninguém a levantou, lhe deu a mão. Eu dei. E mais os vinte escudos que eram toda a minha fortuna.
Eu vi em terras africanas, longe da cidade, um grupo de homens brancos a tentar violar uns miúdos negros, fosse a gozar, fosse a sério, porque riam, gargalhavam, brutais, feios e porcos. E meteu-se em mim uma vontade de lhes bater, espancar, desfazer. Tirei o cinto mas não me atrevi. Era um miúdo. A chama que incendiava as minhas ideias ficou mais acesa.


Eu vi, passando na estrada, centenas, talvez milhares, de operários pedalando fracas bicicletas a caminho das fábricas, pedalando, pedalando, pela aurora, pelo crepusculo, com casacos mal talhados, de sarja pobre, sob a chuva, sob os ventos, com uma malga de caldo no estômago, talvez um bagaço. Ficou mais forte a minha chama. O que quer que fosse a justiça era assunto que me perseguia. Eu vi como muitos fugiam e os coelhos eram mais bravos.


Eu vi como a cobardia é coisa comum e a vergonha raramente a acompanha. Eu vi como um colega se torna delator, como um companheiro fura uma greve, como um estudante engraxa um mestre, como a traição se insinua como um réptil numa relação, como um homem ou mulher tem um preço, não porque trabalha, mas para que roube, engane, trepe mais uma tarimba, conquiste mais uns galões.


Eu vi um povo quase todo adormecido, estupidificado, silencioso, rude, maldoso, acobardado. Mas vi a valentia de camponeses do Alentejo, de operários de algumas fábricas. E a minha chama ficou a arder.


E vi-te. Um pedaço de céu a andar dançando abrindo as águas, uma onda suave e branda, um sopro de brisa numa manhã de Abril, um riso dando música a uma tarde morna de setembro.

Meu amor.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

"Sirius" de Manuel José Marques da Silva

A 18 de Dezembro de 1961, a Índia invadiu os territórios de administração portuguesa com vista à sua libertação.

As tropas portuguesas que lá se encontravam não receberam ordens claras sobre o que fazer. Entre eles encontrava-se Manuel José Marques da Silva, à época comandante da lancha Sirius.

No dia do ataque indiano, sem ter recebido quaisquer instruções do Comando Naval de Goa sobre como actuar em caso de ataque, e depois de ver o navio de guerra Afonso de Albuquerque encalhar, decidiu afundar a lancha.

Como mandam os manuais militares, nos dias seguintes conseguiu evitar fazer-se prisioneiro. Cumpriu as regras e recusou lutar até à morte, como pretendia Salazar.

A salvo com os seus homens, chegou ao Paquistão num cargueiro grego. De regresso a Lisboa, a sua atitude não foi bem recebida por um regime que defendia a resistência na Índia até ao último soldado.

Depois de um processo moroso e sem direito ao contraditório, acabou por ser expulso da Marinha.

Quarenta e seis anos após a invasão de Goa, Damão e Diu, foi lançado o livro Sirius - Índia, 18 de Dezembro de 1961 - Três Casos de Marinha.

Com prefácio de Maria Flor Pedroso, a obra revive a experiência de três militares no dia em que as forças indianas ocuparam os territórios. O comandante Marques da Silva recorda que, após receber ordem para afundar a lancha Sirius, viria a ser proscrito da História da Marinha.

Uma segunda parte é referente ao vice-almirante Fausto Morais de Brito, que deslocou uma outra lancha, a Antares, de Damão para o Paquistão.

Do capitão-tenente Vitor Marques Pedroso são reveladas as cartas no cativeiro em Pondá.

Um livro importante para a compreensão destes acontecimentos da nossa História recente.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Homenagem a Sottomayor Cardia

Liberdade sem Dogma, livro de homenagem a Mário Sottomayor Cardia (1941-2006) e organizado por Carlos Leone e Manuela Rêgo será hoje lançado na Fundação Mário Soares às 19 horas. Sottomayor Cardia destacou-se pela sua coragem física e intelectual. Interveio na sociedade portuguesa como um intelectual controverso, político e académico. Casou em 1964 com a escritora Luísa Ducla Soares. A sua experiência política como Ministro da Educação dos dois primeiros Governos Constitucionais, deputado da Assembleia Constituinte e deputado à Assembleia da República (1983 a 1991) é realizada como meio de levar à prática o seu pensamento político e pretexto para novas reflexões. O livro reúne testemunhos e estudos sobre esta personalidade multifacetada introduzidos por um texto de Carlos Leone, seu antigo aluno de Filosofia Social e Política na Universidade Nova de Lisboa. Dão testemunho do seu convívio com Cardia, Mário Cláudio, José de Vargas dos Santos Pecegueiro, Gastão Cruz, Vasco Vieira de Almeida, António Reis, L.A. Costa Dias, Jorge Miranda, Maria Emília Melo, Mário Soares, José Medeiros Ferreira e Cristina Lisboa. A secção Estudos contém textos de Daniel Melo, Miguel Real, Manuel Filipe Canaveira, José Castelo, João Miguel Almeida, José Leitão, António Braz Teixeira.
Num blogue como o Não Apaguem a Memória, destinado a preservar a memória da resistência e oposição ao Estado Novo, vale a pena esboçar um resumo do trajecto intelectual e político de Sottomayor Cardia durante o período da ditadura, a partir dos diferentes contributos do livro de homenagem.
Mário de Sottomayor Cardia já na adolescência se distingue pelas preocupações intelectuais e desejo de intervenção política, como recorda Mário Cláudio, seu colega de liceu. Em 1955 é expulso do liceu D. Manuel II por tomar posições contra a política colonial portuguesa. Três anos depois apoia a candidatura de Humberto Delgado a Presidente da República. Vem para Lisboa estudar Direito, na Universidade de Lisboa, mas troca este curso pelo de Filosofia. Destaca-se como dirigente estudantil, sendo, em 1961-62, presidente interino da comissão pró-associação académica da Faculdade de Letras. Com Alberto Teixeira Ribeiro, coordena as juntas de acção patriótica dos estudantes da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Intervém activamente na crise académica de 62. Em Maio participa na «greve de fome» na cantina da cidade universitária, sendo um dos mil estudantes presos por tal manifestação. Em Junho é expulso da Universidade de Lisboa por dois anos e meio. Por esta razão, conclui os estudos universitários em Coimbra.
Ainda em 1962, adere ao Partido Comunista Português. Nas eleições de 1965 participa, com José Medeiros Ferreira, nas lutas de unidade da Oposição Democrática as quais, em Lisboa, eram encabeçadas por Mário Soares. É um dos candidatos da Comissão Democrática Eleitoral (CDE) em 1969. Quatro anos antes, o seu trabalho intelectual ganha maior projecção com a sua entrada como redactor para a Seara Nova. Cardia pretende dar nesta revista o seu contributo para encontrar soluções democráticas e socialistas aos problemas da sociedade portuguesa. A relevância do seu papel é reconhecida quando se torna, em 1968, chefe-de-redacção da revista, cargo que exercerá até 1974. António Reis declara no seu testemunho (p.50): «Cardia, não receio dizê-lo, foi a grande alma dessa “Seara”, tal como Raúl Proença o fora da primeira “Seara” dos anos vinte». Data também de 1968 o início do seu afastamento intelectual do PCP, devido a leituras dos acontecimentos da Primavera de Praga divergentes da do seu partido.
O grupo da Seara Nova possuía, além da revista, uma editora, que Sottomayor Cardia encara como uma oportunidade de divulgar e defender as suas ideias. No inicio da década de 70 publica dois volumes de antologia da revista, seleccionando escritos dos seareiros mais importantes durante a I República, obra à qual Manuel Filipe Canaveira dedica o seu estudo. Outros títulos publicados sob a chancela da Seara Nova são o Dilema da Política Portuguesa (1971) e Por uma Democracia Anticapitalista (1973), ambos apreendidos, e Sobre o Antimarxismo Contestatário (1972). Este último livro é escrito como resposta a um livro de António José Saraiva sobre o Maio de 68. Segundo Miguel Real (p, 105), que dedica um ensaio à controvérsia, «ambos os polemistas tinham militado no Partido Comunista Português e ambos tacteavam alternativas políticas e sociais tanto ao sistema político capitalista quanto ao sistema soviético». A heterodoxia marxista de Sottomayor Cardia afirma-se noutro texto de polémica com Pedro Ramos de Almeida, sob o pseudónimo de M.J.A. Teixeira.
Esta heterodoxia que o afastava do PCP leva-o a aderir ao PS aquando da fundação do partido, em 1973, juntamente com António Reis e Marcelo Curto. Mário Soares (p. 62) dá testemunho da importância desta adesão: «Constituiu isso uma considerável mais-valia para o Partido, uma vez que eles tinham então muita influência nos meios esquerdistas civis e militares, na juventude e nos sindicatos.» Por uma democracia anticapitalista é já um livro escrito na esfera ideológica do PS, que diagnostica os bloqueios do regime ditatorial, procurando as possíveis linhas de fractura que permitissem a instauração em Portugal de uma democracia socialista.
A heterodoxia de Cardia facilitava-lhe a discussão com os católicos das relações entre marxismo e cristianismo. José Leitão recorda, no seu texto, os debates sobre este tema promovidos pela Juventude Universitária Católica e onde participaram, juntamente com Sottomayor Cardia, o padre Manuel Antunes e o padre João Resina.
A par da sua actividade partidária, Sottomayor Cardia, intervém, como mostra Daniel Melo no seu estudo, em cooperativas que criticam a situação e buscam alternativas ao regime: a Pragma, a Devir, a Estudos de Documentação; em associações como a Sociedade Portuguesa de Autores e o Centro Nacional de Cultura; em organizações cívicas como a Comissão Promotora de Voto (delegação de Lisboa, 1969), a Comissão nacional de Defesa da Liberdade de Expressão (1971/72), a Comissão Coordenadora do III Congresso de Aveiro (1973), a Comissão de Luta pelas Liberdades Políticas (1973), a Liga Portuguesa dos Direitos do Homem. Ou seja, Cardia era um homem que procurava intervir plenamente na busca de respostas aos problemas do seu tempo, sem abdicar de, pela reflexão, procurar ver além das circunstâncias e de alargar horizontes mentais.
Nota: todas as citações referem-se a LEONE, Carlos; RÊGO, Manuela, Liberdade sem Dogma. Testemunhos e Estudos sobre Sottomayor Cardia, Lisboa, Tinta-da-China, 2007.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Prémio Pessoa para Irene Pimentel


A nossa companheira Irene Pimentel ganhou o Prémio Pessoa de 2007.

Irene Pimentel é, de acordo com o comunicado do júri, uma das figuras mais notáveis da actual historiografia portuguesa.

Com recentes trabalhos publicados em 2007 sobre a história da PIDE, a Mocidade Portuguesa Feminina, os judeus em Portugal e a história das organizações femininas do Estado Novo, Irene Pimentel estuda temas difíceis e polémicos.

Os seus livros, afirma o júri, nunca negam adesão à causa das liberdades e dos direitos humanos, num esforço de rigor intelectual e objectividade académica.

Parabéns Irene!!

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

domingo, 9 de dezembro de 2007

Lançamento do Livro "Mocidade Portuguesa Feminina"




O Livro de Irene Pimentel Mocidade Portuguesa Feminina é lançado no próximo dia 12, às 19:00 horas no Salão Nobre da Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, em Lisboa (Rua Rodrigo da Fonseca, 115).

A editora Esfera dos Livros apresenta assim o livro:

Em 1937, a Mocidade Portuguesa Feminina (MPF) nascia com o objectivo de criar a nova mulher portuguesa: boa esposa, boa mãe, boa doméstica, boa cristã, boa cidadã sempre pronta a contribuir para o Bem comum, mas sempre longe da intervenção política deixada aos homens. A historiadora Irene Flunser Pimentel traça-nos a história deste movimento, obrigatório para mulheres dos sete aos catorze anos, através do Boletim do MPF e mais tarde da revista Menina e Moça, veículos de transmissão dos valores e comportamentos ditados pelo regime salazarista. Ao folhearmos estas páginas, deparamo-nos com raparigas fardadas de bandeira em punho, lições de lavores e trabalhos manuais ou outros afazeres da vida doméstica, indicações sobre o fato de banho oficial com decote pouco generoso e saia não muito curta, lemos textos sobre a atitude a ter em casa com o marido, conselhos sobre livros fundamentais e outros proibidos aos olhos destas jovens e aprendemos as virtudes dos grandes heróis nacionais como D. Filipa de Lencastre ou o Santo Condestável.

O livro será apresentado por Maria de Belém Roseira.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

O NAM na RTP 2 - Programa "Sociedade Civil"

Conforme anunciámos, o programa da RTP 2 "Sociedade Civil" foi dedicado à Memória e, em particular, ao nosso Movimento.

Para quem quiser espreitar

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Colóquio sobre o “Dever da Memória” V


Conforme anunciámos, realizou-se hoje o Colóquio Dever da Memória, organizado pelo Não Apaguem a Memória!

O Colóquio, onde participaram cerca de meia centena de pessoas, foi aberto pelo Presidente do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa, António Avelãs, como anfitrião e moderado por Irene Pimentel.

Joana Lopes, falou do tema Os católicos e a imprensa clandestina. A sua intervenção relatou as experiências relativas à publicação da Revista Direito à Informação, publicada por católicos, clandestinamente, de 1963 a 1969. A Revista, que teve 18 números, foi alvo permanente dos obectivos da PIDE que nunca conseguiu encontrar nem os autores, nem os locais onde era impressa.

De forma imaginativa, aqueles que nela trabalharam conseguiram que a sua divulgação fosse feita em todo o território nacional e nas colónias.

No seu livro, Entre as Brumas da Memória, podemos ler todas as peripécias por que passaram estes anti-fascistas durante os anos em que a Revista foi publicada.

José Augusto Rocha interveio sobre Os tribunais plenários.

No seu estilo habitual falou-nos, de forma brilhante, das experiências enquanto defensor de presos políticos nesses Tribunais de 1969 a 1974.

José Augusto Rocha falou ainda do problema do impedimento dos advogados nos interrogatórios - a lei previa que fossem substituídos pelos próprios PIDES e das chamadas medidas de segurança, que permitiam que os presos estivessem anos atrás das grades.

Foi ainda cumprido um minuto de silêncio em memória de todos os que foram torturados pela polícia política do Estado Novo.

A intervenção de Fernando Rosas centrou-se no problema da Memória.

Para Fernando Rosas, a Memória é "um processo social de construção do significado do passado, do presente e do futuro". A Memória é uma "luta", uma "batalha política" contra a tendência existente nas sociedades ocidentais do seu "apagamento". O chamado "ambiente presente contínuo" do historiador Eric Hobsbawm.

Outro aspecto importante diz respeito ao papel do Estado democrático relativamente à preservação da memória: o Estado democrático não pode ser neutro. Deve criar as condições para que as várias correntes de opinião possam investigar e produzir os trabalhos de investigação que possam levar a sociedade e os cidadãos a escolher a sua própria memória.

Aspecto relevante foi ainda a situação vivida actualmente em Espanha, quer relativamente à lei recentemente aprovada (de que já demos conta neste blogue), quer relativamente aos movimentos de cidadãos existentes com vista à preservação da memória dos derrotados da Guerra Civil e das vítimas do terror franquista.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

O NAM! na RTP 2

O NAM! vai ser tema do Sociedade Civil da RTP2, na próxima quarta-feira, dia 5, a partir das 14h. Vão ser difundidas reportagens com Edmundo Pedro, sobre o Aljube de Lisboa, de Fernando Vicente, sobre a prisão de Caxias e, no estúdio, para responder às questões que vierem a propósito, estará Nuno Teotónio Pereira.

Recorde-se que, no mesmo dia, às 18,00, tem lugar o já anunciado debate sobre o Dever de Memória.



É preciso que o cartoon irónico de Luís Afonso não passe disso, de um sorriso de distanciamento destes “outros tempos”.

“Uma colónia penal para presos políticos”, assim a definiu Salazar. Era uma “necessidade” face aos “novos tempos”, isto é, a guerra civil em Espanha. Para os fundamentalistas do Estado Novo era a certeza da inclemência do regime para com os inimigos. O tempo do “puxão de orelhas dado a tempo”, preferido pelo seu chefe, ia ser substituído pela “disciplina férrea” dos regimes de Hitler e Mussolini. O fascismo português afirmou a sua brutalidade no Tarrafal — “o campo da morte lenta”. De 29 de Outubro de 1936 a 19 de Fevereiro de 1942 recebeu 330 detidos, todos jovens. Morreram lá 32 deles, até Francisco Miguel, o último detido, ser transferido para Caxias no dia 26 de Janeiro de 1954.

“A colónia penal destinar-se-á a presos por crimes políticos que devam cumprir a pena de desterro ou que, tendo estado internados em outro estabelecimento prisional, se mostrem refractários à disciplina (...)” – dizia o Decreto de 23 de Abril. Foi com base nesta imprecisa definição legal que o governo de Salazar enviou para o Cabo Verde mais de 300 perseguidos políticos. Um deles, Acácio Tomás Aquino, fez o inventário deste atropelo legal: “Dos 226 presos a viver no Tarrafal em 1944, 127 estavam ilegais. [Havia] 72 sem julgamento e 55 já tinham cumprido pena, perfazendo, no total, um excesso de 200 anos”.

Só com a Revolução de Abril é que o “campo da morte lenta” efectivamente encerrou, pois a partir de 1961, com a eclosão da guerra colonial, foi reaberto para lá encarcerar os dirigentes dos movimentos de libertação dos países africanos.

Os corpos dos 32 presos portugueses que lá morreram foram exumados e trazidos para o Alto de São João, ficando sepultados junto ao Memorial.

Para que a memória não se apague é fundamental que a Petição do Movimento Cívico Não Apaguem a Memória! seja votada na Assembleia da República.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Ecos da Guerra Civil espanhola em Barrancos

É amanhã lançado na Biblioteca Museu República e Resistência (Espaço Cidade Universitária) o livro de Dulce Simões, Barrancos na encruzilhada da Guerra Civil de Espanha. Trata-se de uma obra baseada nas memórias de Gentil Valadares, filho de António Augusto Seixas, um tenente da Guarda Fiscal de Barrancos que protegeu cerca de mil refugiados republicanos que fugiam de povoações vizinhas de Espanha, ante o avanço dos sublevados nacionalistas, em 1936. Fê-lo, contrariando as ordens de Salazar e pondo em risco a sua carreira.
Hoje, no magazine Pública, Carlos Pessoa conta-nos a história de "António Seixas: o oficial que salvou centenas de espanhóis da guerra civil". Foi ouvir Manuel Méndez Garcia (92 anos), um desses refugiados salvos por António Seixas, e alguns dos seus contemporâneos. Percebe-se que além de ser um republicano convicto, António Seixas foi movido pelo espírito humanitário.

Colóquio sobre o “Dever da Memória” IV


O Movimento Cívico Não Apaguem a Memória! (NAM!) aguarda desde 30 de Março que os deputados votem o dever de memória para com os resistentes que durante a ditadura fascista lutaram pelas liberdades democráticas.

O projecto de Resolução que consagra o dever de memória resultou da Petição apresentada pelo NAM! ao presidente da Assembleia da República, em 26 de Julho de 2006. Talvez por o assunto não ser de nenhum partido propriamente dito, a sua votação tem sido adiada. Consideramos ser fundamental desfazer o impasse que se criou em torno da sua votação.

Por isso lançámos uma Carta Aberta aos Deputados e vamos organizar um colóquio sob o tema Dever de Memória. Com estas acções pretendemos recordar à Assembleia da República a urgência em votar o parecer aplaudido em 30 de Março.

O colóquio de Lisboa realiza-se no próximo 5 de Dezembro, das 18h às 20h30, no auditório do SPGL, Rua Fialho de Almeida nº 3 (Bairro Azul) - Metro S. Sebastião.

Joana Lopes: os católicos e a imprensa clandestina
José Augusto Rocha: os “tribunais plenários”
Fernando Rosas: os arquivos e os juízes dos “tribunais plenários”
A historiadora Irene Pimentel será moderadora do debate.

Contamos consigo para que o cartoon do Luís Afonso não nos faça sorrir.
Contamos consigo no colóquio

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Colóquio sobre o “Dever da Memória” III

Colóquio sobre o Dever da Memória

Carta a uma jovem portuguesa – revisitação

A propósito da realização do colóquio sobre o dever da memória para com a resistência antifascista, a realizar no próximo 5 de Dezembro no auditório do SPGL (18h), recuperam-se aqui algumas recordações desse tempo que caracterizam a mentalidade da época. No final propõe-se um contraste sarcástico, feito por uma mente libertária, de hoje e sempre, a propósito do que se escrevia nas revistas desse tempo e os modelos sociais que se propunham às mulheres.

No dia 19 de Abril de 1961 a Via Latina, revista da Associação Académica de Coimbra publicou uma Carta Aberta que tinha por destinatária “uma jovem portuguesa”. Era afectuosa e despreconceituosa. A revista foi objecto de uma polémica de tal modo feroz por parte dos sectores conservadores da sociedade portuguesa, com os jornais ultra-católicos Voz e Novidades a comandar as hostes, que a Via Latina foi obrigada a afastar o autor da Carta a uma Jovem Portuguesa, Marinha de Campos, para evitar o seu encerramento compulsivo pelas autoridades administrativas, por ultraje à moral pública.

O que dizia assim de tão escandaloso esta Carta? Transcrevem-se as partes principais (retiradas de Álvaro Garrido, Movimento Estudantil e Crise do Estado Novo, ed. Minerva, Coimbra, 1996):

Vou escrever para ti jovem portuguesa e particularmente para ti, jovem estudante da nossa cidade. Não tenho a fazer a apologia de qualquer tipo de ideal; ensinar-te qualquer doutrina, defender fanaticamente uma moral (…)
A minha liberdade não é igual à tua. Separa-nos um muro alto e espesso, que nem tu nem eu construímos. A nós, rapazes, de viver do lado de cá, onde temos uma ordem social que em relação a vós nos favorece. Para vós, raparigas, o lado de lá desse muro; o mundo inquietante da sombra e da repressão mental (…)
Só nos é permitido atravessar o muro para escolhermos. E eu escolho-te a ti jovem portuguesa (…)
Tu, vítima de todos nós e de ti mesma. Tu, vítima do nosso desejo não concretizado e portanto falseado e iludido (…)
Tens a inconsciente e mal definida sensação de que há um sistema social mais forte que tu ou eu e no qual devemos integrar, sob pena de ficarmos sós e desamparados. Há um determinismo social que te oprime e te define (…)
Viver dentro da juventude não se ensina, aprende-se vivendo. E a jovem e o jovem português não vivem dentro dela (…)
Jovem Portuguesa! Dou-te a minha mão e o meu corpo. Sinto os teus dedos, o teu braço. Sinto um corpo jovem junto do meu. Mas não sou um molde; sou um jovem diferente de ti. Um rapaz para quem o amor por ti é a concretização sexual, única diferença nas relações entre o homem e a mulher que devem decorrer no mesmo plano de homem para homem.


O autor desta Carta tornou-se advogado, afastou-se das lides literárias e nunca mais esqueceu a mágoa de ter ficado sozinho no meio da aridez de inteligência e generosidade que era o meio social do seu tempo. Ele, um humanista que politicamente tinha uma atitude discreta, estivera em Paris alguns meses e, quando regressara, o choque cultural com a realidade atávica do Portugal beato fê-lo lançar um grito de alerta e dor. Mas melodioso. Foi calado. Não esqueceu.

Há algumas semanas um anónimo libertário, para quem a memória não se deve apagar, pegou nalgumas “pérolas” da investigação que andava a fazer, enfiou-as num colar deu-as aos porcos, o que é uma maneira de dizer aos marialvas.

Porque o mundo de hoje se faz também com esta massa, que embora levedada tem tendência a azedar, mas sem a hipocrisia do falso pudor, aqui se reproduz este Canto de Saudade aos Homens de Hoje.

Para que não nos esqueçamos dos outros tempos…

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Colóquio sobre o “Dever da Memória” II

Deixamos aqui a biografia dos intervenientes no Colóquio já anunciado:

Joana Lopes
Nasceu em Moçambique, licenciou-se em Filosofia e doutorou-se em Lógica Matemática na Universidade de Lovaina (Bélgica). Pertence à geração dos católicos progressistas que se desenvolveu no Encontro, jornal da JUC (Juventude Universitária Católica), com Bénard da Costa. Mas o seu caso é particular, pois tendo chegado a Lisboa já no rescaldo da crise académica, em 1963, a sua participação, para além da docência na Faculdade de Letras de Lisboa, centrou-se na informação. Colaborou no Tempo e o Modo, de Alçada Baptista e Pedro Tamen, e, principalmente, no Direito à Informação, publicação animada por Nuno Teotónio Pereira e a sua mulher, Natália (já falecida), que surgiu sob a égide da encíclica Pacem in Terris, do Papa João XXIII. Esteve na fundação da cooperativa cultural Pragma, em 1964, que três anos depois foi encerrada pela PIDE, devido a um ciclo de conferências sobre a emigração.
A sua formação académica levou-a a especializar nas tecnologias da informação , nesse campo, fez parte da direcção executiva da IBM em Portugal e participou em diversas acções de formação em La Hulpe, no centro belga desta conhecida marca de material de informática.
Em Fevereiro deste ano pôs em livro as memórias e actividades do sector conhecido por católicos progressistas, com o título Entre as Brumas da Memória – Os católicos portugueses e a ditadura, onde coligiu documentação essencial sobre o percurso de alguns dos membros deste grupo, que os levou à luta armada para derrubar o regime corporativo do Estado Novo e muitos outros mais à prisão.

José Augusto Rocha
Pertence à geração da crise académica de 1961/62. Membro da direcção da Associação Académica de Coimbra (AAC) foi um dos organizadores do I Encontro Nacional de Estudantes, que se realizou em Coimbra de 9 a 11 de Março de 1962, contra a proibição ministerial, e se destinava a preparar o Dia do Estudante de 24 de Março. A proibição da realização deste evento desencadeou uma crise académica em Lisboa e em Coimbra, que teve repercussão nacional. A repressão fez-se sentir sobre centenas de estudantes, em particular sobre os mais expostos. José Augusto Rocha foi detido em 19 de Maio, com mais 38 colegas, e conduzido para a prisão de Caxias, acusado de ter participado na ocupação das instalações da AAC. Do processo disciplinar que daí resultou foi expulso de todas as Universidades do país por dois anos.
Humanista e homem de esquerda, foi, já advogado uma das figuras mais constantes nos famigerados “tribunais plenários”, na defesa dos presos políticos.
Nos tribunais plenários, “as sentenças estavam previamente fixadas, o diálogo era quase impossível e a margem de manobra era muito estreita”. Numa notável intervenção que fez na sede da Ordem dos Advogados [24/6/07], contou como os julgamentos atingiam “momentos dramáticos” e como foi “necessária muita coragem e muita determinação para travar combates desiguais em defesa dos presos políticos, pelos seus direitos, pela liberdade, contra a opressão e a violência”.
É a segunda parte dessa palestra que J. A. Rocha traz ao colóquio de 5 de Dezembro.

Fernando Rosas
Integrava a comissão pró-Associação dos Liceus quando eclodiu a crise académica de 61/62. Participou, a esse nível, na contestação estudantil, que se politizou e levou à contestação radical do regime corporativo de Salazar. Foi preso em Dezembro de 1964, por pertencer ao PCP, de que se afastou mais tarde, e fez parte dos acusados no processo dos estudantes de 1965, sem deixar de participar na luta político-estudantil. A denúncia dos crimes da guerra colonial e da política ultramarina do regime levou-o à fundação do MRPP (Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado), de que se afastou já depois do 25 de Abril. Teve um papel activo na criação do Bloco de Esquerda, de que é deputado e por quem foi candidato à Presidência da República em 2001.
A sua carreira de historiador levou-o a interessar-se pela contemporaneidade do século XX, onde o Estado Novo ocupa um espaço de 48 anos e de que Rosas se tornou num dos mais importantes historiadores. Na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, de que é catedrático, organizou em Novembro o curso História, memória e democracia, onde em discussão esteve o “dever de memória” e o exemplo espanhol foi largamente abordado, com a participação de académicos e políticos espanhóis, entre eles, Santiago Carrillo e Raul Morodo.
No decorrer de uma das intervenções que fez neste curso, Fernando Rosas deu conta de uma investigação que está a dirigir sobre os juízes dos “tribunais plenários” e do seu percurso na magistratura portuguesa.

Irene Pimentel
Pertence à segunda geração dos investigadores da nossa história contemporânea e História da PIDE (ed. Círculo dos Leitores), que lançou no final do mês de Outubro, é o seu mais recente contributo para esse estudo. O seu anterior trabalho, feito em conjunto com João Madeira e Luís Farinha, tratava, como o título denota, das Vítimas de Salazar – Estado Novo e Violência Política (ed. Esfera dos Livros, 2007). Em 2000 publicou um exaustivo estudo sobre História das Organizações Femininas no Estado Novo (ed. Círculo dos Leitores), abrindo novos caminhos para a investigação sobre a formação das mentalidades no Portugal do século XX.
Outro campo das suas investigações incide sobre a II Guerra Mundial, em especial sobre os refugiados que chegaram a Portugal, destacando-se, aqui, a obra que publicou em 2006, Em Fuga de Hitler e do Holocausto (ed. Esfera dos Livros).
Dentro do Movimento Cívico Não Apaguem a Memória! integra o grupo de trabalho que estuda a criação de um espaço de memória na antiga sede da PIDE/DGS, que se situava na Rua António Maria Cardoso, onde hoje se edifica um condomínio privado.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Colóquio sobre o “Dever da Memória” - I



O projecto de Resolução que consagra o dever da memória em letra de lei da República aguarda votação desde que foi discutido em plenário, no passado 30 de Março. Todos os deputados intervenientes saudaram o NAM! e concordaram com o parecer de resolução apresentado pelo deputados Marques Júnior.
A muitos parece inexplicável este comportamento, que adia por mais um ano a concretização, por parte do Estado de Direito, do dever de memória para com a resistência antifascista e democrática, cujo legado faz parte insubstituível da História do século XX.
O projecto de Resolução resultou da Petição apresentada pelo NAM! em 26 de Julho de 2006 ao presidente da Assembleia da República. Consideramos ser fundamental desfazer o impasse que se criou em torno da sua votação.
Por isso lançamos uma Carta Aberta aos Deputados e vamos organizar um colóquio sob o tema Dever de Memória, para recordar aos deputados a urgência em votarem o parecer que aplaudiram em 30 de Março.
O colóquio de Lisboa realiza-se no próximo 5 de Dezembro, das 18h às 20h30, no auditório do SPGL, Rua Fialho de Almeida nº 3 (Bairro Azul) - Metro S. Sebastião.

O formato será o de intervenções de cerca de 15 minutos para cada orador, pela seguinte ordem:

Joana Lopes: Os católicos e a imprensa clandestina
José Augusto Rocha: Os “tribunais plenários”
Fernando Rosas: Os arquivos e os juízes dos “tribunais plenários”
A historiadora Irene Pimentel será moderadora do debate.

Contamos consigo para que o colóquio decorra com o êxito esperado.

Planta da Rua Fialho de Almeida

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Carta Aberta - Dever de memória, é urgente!


O Movimento Cívico Não Apaguem a Memória! (NAM!) apresentou à Assembleia da República uma Petição onde se reclamava o respeito pelo "dever da memória" por parte do Estado.
Essa Petição, em forma de projecto de Resolução, foi discutida em sessão plenária no passado 30 de Março, tendo recebido de todas as bancadas parlamentares acolhimento positivo.
A votação devia realizar-se numa das sextas-feiras seguintes, dia em que são votadas as matérias consensuais. Infelizmente desde então aguarda-se o agendamento dessa Resolução para uma destas sextas-feiras.

Por isso, à beira do fim do ano, decidiu o NAM! desencadear um processo de sensibilização da opinião pública, no sentido de conseguir que antes do final de 2007 haja votação da Resolução, através de uma Carta Aberta aos Deputados.
Foi entregue na Assembleia da República no dia 22 de Novembro e foram seus primeiros signatários:

A. Borges Coelho (Historiador)
Ângelo Correia (Antigo deputado)
Carlos Brito (Antigo deputado)
Edmundo Pedro (Antigo deputado)
Fernando Rosas (Historiador e actual deputado)
Hélder Costa (Encenador)
Irene Pimentel (Historiadora)
Iva Delgado (Presidente da Fundação Humberto Delgado)
José Saramago (Prémio Nobel)
Martins Guerreiro (Almirante)
Nuno Teotónio Pereira (Arquitecto)

Carta aberta aos Deputados, aos Grupos Parlamentares e ao Presidente da Assembleia da República:

Em 5 de Outubro de 2005, um grupo de cidadãos que não se conformou com a transformação em condomínio privado da antiga sede da PIDE/DGS sem uma referência que evocasse a memória do mais sinistro local da repressão da ditadura, decidiu manifestar-se no local e exigir dos poderes públicos uma intervenção que traduzisse o Dever de Memória por parte do Estado Português.

Desta iniciativa cívica nasceu o Movimento Não Apaguem a Memória, um movimento aberto e plural, sem dependências partidárias, que tem desenvolvido, particularmente em Lisboa e no Porto, um conjunto de iniciativas, nomeadamente:

· apresentação de uma Petição com mais de 5000 subscritores dirigida à Assembleia da República para que o Parlamento vincule o Estado português a cumprir o Dever de memória;
· diligências visando a transformação da antiga prisão política do Aljube em museu da Resistência e da Liberdade;
· movimentações para a criação de uma área museológica no futuro condomínio privado em construção no local da antiga sede da PIDE/DGS, em Lisboa;
· acções tendentes à consagração do edifício onde funcionou a delegação do Porto da PIDE/DGS como local de memória da luta contra a ditadura na região do Grande Porto;
· contactos visando a transformação do antigo campo de concentração do Tarrafal num espaço de memória dos países da CPLP no seu processo de luta pela abolição da ditadura e do colonialismo e de conquista da liberdade e da soberania, através de entendimentos com o Presidente da República de Cabo Verde.

As iniciativas levadas a cabo pelo Movimento cívico Não Apaguem a Memória – exemplo a seguir pela sociedade civil – tem tido boa receptividade por parte do Governo, da Câmara Municipal de Lisboa, do construtor do referido condomínio privado e do Governo Civil do Porto.

Na sequência da Petição apresentada, o deputado Marques Júnior – um capitão do MFA que restituiu a Liberdade a Portugal, em 25 de Abril de 1974 – elaborou um projecto de Resolução parlamentar que foi discutido na generalidade em Março de 2007, reunindo largo consenso, e que aguarda aprovação desde então.
Urge que seja aprovada na Assembleia da Republica a Resolução que venha concretizar as legítimas aspirações da sociedade portuguesa, expressas pelo Movimento Cívico Não Apaguem a Memória!.

Por tal razão, vêm os subscritores desta carta aberta apelar aos Deputados, aos Grupos parlamentares e ao Presidente da Assembleia da República para que envidem os esforços necessários no sentido de permitir a aprovação ainda este ano da Resolução parlamentar que vincula o Estado português ao Dever de memória.

Memória de luta pela liberdade e pela democracia cujo exemplo deve ser salvaguardado para as novas gerações.

Porque sem memória colectiva não há identidade histórica, indispensável à construção do futuro.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Novas recensões a livros sobre a resistência anti-salazarista

Sairam na edição deste mês do Le Monde Diplomatique - ed. portuguesa recensões críticas aos livros Por teu livre pensamento e Entre as brumas da memória, ambas por Daniel Melo.
O livro Por teu livre pensamento é da autoria de Rui Daniel Galiza (textos) e João Pina (fotos), e recolhe um conjunto de testemunhos de 25 ex-presos políticos, contendo ainda notas biográficas sobre os mesmos.
O livro Entre as brumas da memória é um testemunho de Joana Lopes sobre a actividade dos católicos progressistas nos anos 60.
Às duas obras já aqui nos referiramos, aquando dos respectivos lançamentos este ano (vd. etiquetas na coluna da direita começadas com «livro», seguidas do título da obra correspondente).
Nb: imagem do Monumento aos presos políticos, escultura de Jorge Vieira.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Seminário "Memória & Testemunhos Orais"


A Fundação Mário Soares e o Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa realiza nos dias 22 e 23 de Novembro de 2007 um Seminário Internacional sobre o tema genérico Memória & Testemunhos Orais.

De acordo com o site da Fundação, o Seminário Internacional Memória & Testemunhos Orais pretende dar a conhecer e discutir o estado da arte em matéria de História Oral, recolhendo experiências nacionais e internacionais.

Esta iniciativa reúne especialistas de diferentes unidades de investigação e visa incorporar conhecimentos e práticas de outras áreas, designadamente da comunicação social, procurando ainda abordar os desafios que a História Oral suscita nos âmbitos arquivístico e dos direitos de autor.

  • O programa pode ser consultado aqui.
  • Exposição "Memória da Guerra Colonial"


    A Fundação Mário Soares inaugurou, no passado dia 12, a exposição Memória da Guerra Colonial com fotografias de Américo Estanqueiro.

    Do anúncio da exposição:

    Ao evocar aqui a memória da guerra colonial – a memória concreta que esta exposição apresenta – estamos a “revisitar” esses tempos e, segundo espero, a retirar as lições de tais acontecimentos e dos sofrimentos que a guerra provocou em todos nós. Mas também a olhar para o futuro de amizade e cooperação que hoje nos aproxima tanto desses povos irmãos, agora independentes. Daí, também, os esforços que a Fundação Mário Soares tem desenvolvido na preservação e divulgação da Memória histórica de Portugal e dos países da CPLP, com a certeza de que o que nos une é um instrumento essencial do progresso dos nossos países.

    Encontro Ibérico - Reflexões em torno de María Zambrano


    No próximo dia 22 de Novembro decorre no Instituto Cervantes, em Lisboa, o Encontro Ibérico - Reflexões em torno de María Zambrano.

    Filósofa de referência, María Zambrano nasceu em Málaga em 1904.

    Em 1921 iniciou estudos de Filosofia como aluna livre na Universidade Central de Madrid. Completou os estudos em 1927 e, em 1931 já era professora auxiliar de Metafísica na Universidade Central.

    Casou, em 1936, e partiu para Santiago de Chile.

    Já durante a Guerra Civil de Espanha, em 1937, no mesmo dia em que caiu Bilbau, María e o marido regressaram a Espanha.

    Ele alistou-se no exército e María passou a colaborar na defesa da República como Conselheira de Propaganda e Conselheiro Nacional para a Infância Evacuada.

    Em Janeiro de 1939 partiu para o exílio.

    Passou por Paris, Nova Iorque, Havana e México. Neste último país leccionou filosofia na universidade.

    Viveu em Paris de 1946 a1949 e depois Havana, de novo.

    Em 1953 regressou à Europa e escolheu Roma para viver até 1964, relacionando-se com intelectuais italianos e com espanhóis exilados como Ramón Gaya, Diego de Mesa, Enrique de Rivas, Rafael Albertie Jorge Guillén.

    Em 1964, publicou Claros do bosque.

    Fixou residência em Genebra, quando no seu país começou a ser apreciada, ao ser nomeada Filha Adoptiva do Principado das Astúrias.

    Em 1981 recebeu o Prémio Príncipe das Astúrias de Comunicação e Humanidades. Em 1982 foi-lhe atribuído o título de doutora honoris causa. Em 1987 abriu a Fundação com o seu nome e em 1988 foi a primeira mulher a receber o Prémio Cervantes. Em português tem diversas obras traduzidas, nomeadamente O Homem e o divino e Os Sonhos e o Tempo.

    Morreu em Madrid em 1991.

    segunda-feira, 12 de novembro de 2007

    Os cantos do Zeca

    O cantautor José Afonso será homenageado este domingo com um espectáculo no Fórum da Maia, numa organização da Associação José Afonso.
    Aproveita-se para divulgar a informação sobre o mesmo inserta no blogue daquela associação:
    "No próximo dia 18, domingo, pelas 16 horas, no Fórum da Maia, vai ser levado à cena o espectáculo «OS CANTOS DO ZECA».
    Esta iniciativa da responsabilidade da Associação José Afonso (fundada em 18 de Novembro de 1987), por intermédio do seu Núcleo do Norte, mistura músicos, actores, técnicos, profissionais e amadores, com o objectivo central de celebrar a vida e obra de José Afonso e percorrer vários «cantos» do «poeta, andarilho e cantor».
    Os «CANTOS DO ZECA» significará prestar um tributo aos vários «cantos» por onde o Zeca passou: Portugal, África, Galiza.
    Os «CANTOS DO ZECA» significará, também, prestar um tributo aos vários «cantos» onde ele tem sido cantado por gente que faz da música e das palavras de José Afonso uma vontade de construir mundos sem muros nem ameias.
    Do Porto, de Castelo de Paiva, de Lisboa, do Alentejo, de Viana do Castelo, de Penafiel, de Braga, de Guimarães, da Galiza chegam cantores e actores que, principalmente durante este ano, têm sido «companheiros de estrada» do Núcleo do Norte da AJA.
    Os «CANTOS DO ZECA» significará, ainda, prestar um tributo aos poemas e canções que José Afonso nos legou como forma de, ainda hoje, conseguirmos perceber «o que faz falta».
    Num espectáculo construído e desenhado cenicamente pelo Núcleo do Norte da AJA, José Afonso vai «estar presente» porque com ele percorremos estes 20 anos de caminho.
    Os bilhetes, ao preço de 7,50€ estão à venda na Cooperativa UNICEPE (Praça de Carlos Alberto), Sindicato dos Professores do Norte (Rua D. Manuel II) e Sindicato dos Seguros (Rua do Breiner) podendo ser feitas reservas pelo endereço: ajanorte@gmail.com
    Contactos: Paulo Esperança (Telem. 917711964), José Carlos Pereira (Telem. 916090033)"

    domingo, 11 de novembro de 2007

    11/11/1975 - Independência de Angola




    Após 14 anos de guerra a independência de Angola foi proclamada por António Agostinho Neto, primeiro Presidente da República Popular de Angola e do MPLA.

    Foi às 23:00 horas do dia 11 de Novembro de 1975 que Agostinho Neto proclamava "diante da África e do mundo" a Independência de Angola.

    quarta-feira, 7 de novembro de 2007

    Blogger mais anciã do mundo é antifascista, galega e socialista

    É verdade, a blogger mais anciã do mundo é antifascista de velha cepa, galega e socialista. Chama-se María Amelia López, nasceu em Muxia (A Coruña) a 23/12/1911 e publica regularmente no seu blogue A mis 95 años, que criou com a ajuda do neto Daniel, em 2006. Ganhou esta 2.ª feira o Prémio Best of Blogs (BOBs) na categoria de blogues em língua castelhana.
    Numa entrevista que reproduz no seu blogue, López não tem papas na língua para descrever a barbárie franquista; veja-se esta resposta ao leitor Centauro:
    Abordou o franquismo em 4 posts (vd. aqui), referindo-se à Guerra civil (que trata como uma invasão, como diz acima), à fome e à violência política. Socialista desde jovem, nunca aderiu a um partido por saber que podia sofrer represálias por isso. Foi multada por se ter recusado a apoiar o movimento nacional falangista (vd. aqui).
    O seu blogue tem uma versão em língua portuguesa, que pode ser vista aqui.
    Aqui fica também o nosso reconhecimento pelo seu exemplo.
    Nb: o sup.º P2 do Público dedicou-lhe uma reportagem ontem, pela mão de Joana Amaral Cardoso (p. 10/11); a imagem foi retirada do próprio blogue.

    domingo, 4 de novembro de 2007

    Espanha e Portugal – o mesmo dever da memória


    As Cortes espanholas aprovaram no passado 31 de Outubro a Lei da Memória Histórica que reabilita as vítimas da ditadura franquista.

    A Assembleia da República tem para votação, desde 30 de Março deste ano, uma Resolução que nessa sexta-feira foi discutida em plenário sem oposição de nenhum grupo parlamentar.

    Esta Resolução, cujo parecer coube ao deputado Marques Júnior, foi suscitada por uma Petição apresentada pelo Movimento Cívico Não Apaguem a Memória! (NAM!). Se querermos insistir em desnecessárias comparações, julgamos que é tempo do Estado português, representado na Assembleia da República, tomar uma posição de reconhecimento público e histórico sobre a resistência à ditadura do Estado Novo.

    Espaço de memória na sede da ex-PIDE/DGS (Rua António Maria Cardoso)

    O NAM! criou-se a partir de uma manifestação de protesto pela destruição da antiga sede da polícia política salazarista, sem que naquele edifício da “Antónia Maria Cardoso”, em Lisboa ficasse qualquer memória do que ele significou de abnegação e de sacrifício por parte dos milhares de cidadãos que ali foram interrogados, torturados pelos esbirros do fascismo português, designados por “pides” ou “bufos”, até à morte, em alguns casos.

    A partir daí foi possível criar uma base de trabalho com a Câmara Municipal de Lisboa e com o promotor imobiliário do novo edifício, no sentido de preservar, num espaço apropriado, a luta pela democracia, que aquele lugar também personifica. As conversações principiaram em 10 de Abril de 2006, tiveram algum desenvolvimento e permitiram delimitar o espaço destinado ao memorial, mas foram interrompidas pelas recentes eleições intercalares para o executivo camarário.

    O NAM! entendeu que passados quatro meses sobre a eleição do novo executivo (1/8/07) era tempo de reatar as conversações e solicitou uma audiência ao novo presidente do município, António Costa.

    O pedido foi prontamente anuído e na passada terça-feira, 30 de Outubro, uma delegação do Movimento foi recebida pelo Dr. António Costa. A audiência prolongou-se por mais de uma hora e permitiu repor na agenda que o NAM! tem com a CML a necessidade de preservar a memória da resistência na Rua António Maria Cardoso e, também, de noutros locais e de outros modos que nos assegure que as novas gerações não esquecerão o que foi a luta pela democracia em Portugal.

    António Costa afirmou o seu empenho e o do seu executivo em colaborar com os fins do NAM! e referiu, em resposta à exposição que lhe fora feita por Fernando Vicente, coordenador do Grupo de Trabalho da “António Maria Cardoso”, ser lógico que a CML assumisse a propriedade do espaço no imóvel destinado ao memorial como um seu condómino. Considerou, em princípio, que o desenho museológico desse memorial poderia vir a ser feito pelo NAM!, se assim o entendêssemos. Assumiu o compromisso de vir e a estudar com a restante vereação e respectivos serviços a melhor forma de poder ajudar na concretização do projecto. Assegurou que a CML iria em breve indicar ao NAM! um interlocutor para este assunto.

    A reunião permitiu abordar outros aspectos da afirmação do dever da memória no município de Lisboa, pondo Raimundo Narciso, que fazia parte da delegação, a tónica na organização temática dos “roteiros” que permitam a realização de passeios históricos nos lugares da cidade onde a defesa da democracia implicou a prisão, o espancamento e a morte. Em complemento a esta proposta frisou a necessidade deste conhecimento do passado fazer parte dos curricula escolares, designadamente das escolas que estão a cargos da CML. Pôs ainda na agenda a possibilidade de o NAM! vir a usufruir de uma sede num dos edifícios que a CML lhe possa disponibilizar. Esta foi uma proposta que António Costa considerou merecer reflexão, bem como a que fizera o terceiro elemento da delegação, Duran Clemente, quando deu conta da possibilidade dos lugares da resistência ficarem assinalados com lápides, como a colocada no Tribunal da Boa-Hora, em Lisboa, por iniciativa do NAM!, a 6 de Dezembro de 2006, recordando que ali funcionaram os “Tribunais Plenários”, um arremedo de justiça, na realidade extensão do braços repressivo da PIDE/DGS.

    A prisão do Aljube – Museu da Liberdade e Resistência

    O NAM! recorda que no passado 19 de Outubro teve uma outra audiência com o ministro da Justiça, Alberto Costa, a terceira com este titular, que teve por objecto a conversão do edifício da antiga prisão do Aljube, em Lisboa, num Museu da Liberdade e Resistência ou num pólo destacado de uma rede de Museus nacionais sobre este tema.

    A conversa decorreu de modo francamente coloquial, com o Dr. Alberto Costa a referir o seu empenho de cidadão na concretização desse objectivo, mas recordando que a propriedade do imóvel era do Ministério das Finanças, que podia ter outros desígnios para aquele espaço. Acrescentou, no entanto, que enquanto ele estivesse afecto ao Ministério da Justiça e ele fosse o seu titular tinha uma total disponibilidade para encontrar com o NAM! um lugar condigno para a instalação desse museu, que ele também considerava necessário no Portugal democrático.

    No decorrer da conversa foram avaliadas as possibilidades de transformação do antigo Aljube num espaço museológico, tendo o ministro avançado com duas hipóteses a considerar:

    1. Através da constituição de uma fundação tendo o NAM! como referência estatutária, com o objectivo específico de criar e gerir o futuro museu. Nesse caso o papel do Estado seria unicamente o de ceder o espaço para o efeito;
    2. Ou assumir esse papel de instalação do museu através do Ministério da Cultura. Considerou, nesse caso, que o NAM! deveria projectar-se como um assessor privilegiado de consulta e aconselhamento na realização do projecto.

    No decurso da audiência foi levantada a possibilidade de ali vir a instalar-se a sede do NAM! , proposta que o ministro considerou de ponderar, para ela muito contribuindo a decisão governamental de transformar ou não o Aljube num pólo museológico “Resistência e Liberdade”.

    Tarrafal – colóquio internacional em 2009

    Passou no passado 29 de Outubro mais um aniversário sobre a instalação em cabo Verde do “campo da morte lenta” do Tarrafal, um campo de concentração criado em 1936 pelo Estado Novo, para aí poder isolar até ao fim os seus opositores mais determinados.

    Vale a pena referir que a efeméride foi assinalada pela RTP2, com um documentário de qualidade, assinado por Fernanda Paraíso e produzido pela Take 2000. Através dele pudemos seguir os percursos e motivações de cinco antigos “tarrafalistas”: Sérgio Vilarigues, Josué Romão (entretanto falecidos) e de José Barata e Edmundo Pedro.

    O NAM! , através do Edmundo Pedro, seu membro desde a primeira hora, está a participar na organização de um colóquio internacional, a realizar no 1 de Maio de 2009, dia em que em no ano de 1974 uma manifestação popular fechou o presídio do Tarrafal e de lá libertou os derradeiros presos dos movimentos independentistas africanos, lá detidos desde 1961.

    Este colóquio está a ser concebido com o apoio do Presidente da República de Cabo Verde, Pedro Pires, e do Ministério da Cultura de Portugal. Tem como seus principais impulsionadores Edmundo Pedro e Pedro Martins, arquitecto cabo-verdiano a residir em Nova Iorque, ambos antigos presos do Tarrafal.

    António Melo

    Alexandre Babo in memoriam (1916-2007)

    Faleceu esta sexta-feira o antifascista Alexandre Babo, aos 91 anos de idade. O seu féretro está hoje em câmara-ardente na Igreja Paroquial da Parede e o funeral realiza-se amanhã.
    Alexandre Babo nasceu em Lisboa a 30/9/1916. Em 1933 ingressou na Faculdade de Direito de Lisboa e em 1936 entrou para a Maçonaria, militando na Acção Anticlerical e Antifascista e no Bloco Académico Antifascista, onde lutou contra o salazarismo.
    Com Amaral Guimarães e Abílio Mendes fundou as Edições Sirius, em 1941, que deram uma relevante contribuição cultural. Após a guerra, muda-se para Paris, como delegado da revista Mundo Literário.
    Tornou-se militante do PCP desde 1943, tendo também participado no Socorro Vermelho, uma organização ligada à Internacional Comunista. Como advogado interveio em defesa de presos políticos nos julgamentos do Tribunal Plenário do Porto. Fez parte do Conselho do Porto do MUD e da Comissão Distrital da Campanha do General Norton de Matos, em 1948/9.
    Foi co-fundador e director do Círculo de Cultura Teatral e do Teatro Experimental do Porto, tendo neste convidado António Pedro para encenador. Em 1959 saiu do TEP para fundar o Teatro Moderno, com Luís de Lima e Fernando Gaspar, sediado no Clube dos Fenianos, também no Porto. Várias das suas peças foram proibidas e apreendidas pela censura salazarista, nomeadamente Estrela para um epitáfio (1961) e Jardim público (1972), bem como os seus livros de contos Autobiografia (1957) e Sem vento de feição (1972).
    Em 1960 muda-se para Londres, como correspondente do Jornal de Notícias e colaborador da BBC. Em 1964 regressa ao país, e funda O Palco Clube de Teatro, em Lisboa.
    Em 1973 é um dos fundadores da Associação Portuguesa de Escritores (APE), tendo sido sócio da sucessora SPA desde 1977. Co-fundou ainda a Liga para o Intercâmbio Cultural Social Científico com os Povos Socialistas, a Associação Portugal-URSS e a Associação Portugal-RDA.
    Foi colaborador regular das secções literárias de várias revistas e jornais. Entre a sua vasta obra literária, destacam-se as suas peças teatrais, os seus textos de crítica teatral e os livros autobiográficos Recordações de um caminheiro - entre duas guerras (1984), Recordações de um caminheiro - a longa espera (1993), Carlos Babo: o espírito da resistência (1995) e No meu tempo (1999).
    Fontes principais: Infopedia, SPA e Urbano Tavares Rodrigues («Alexandre Babo escritor e revolucionário», in Avante!, n.º 1386, 21/6/2000). Nb: imagem retirada daqui.

    quinta-feira, 1 de novembro de 2007

    O Movimento Cívico "Não Apaguem a Memória!" vai transformar-se!


    O Último Plenário (13º) em resumo:

    No 13º Plenário do Movimento Cívico Não Apaguem a Memória!, realizado a 20 de Outubro de 2007, foi aprovada a transformação do Movimento em Associação.

    A proposta que consubstancia os termos deste processo, apresentada pelo Grupo de Ligação, estabelece os seguintes pontos:

    1 – Apresentar, até 15 de Dezembro, através da lista TODOS, um projecto de estatutos, um projecto de regulamento interno e um projecto de regulamento eleitoral da futura associação que salvaguardem os princípios e objectivos da Carta do Movimento, favoreçam a máxima participaçăo de todos os seus membros e preservem, tanto quanto possível, a melhor prática que já é património do Movimento.

    2 – Apresentar até 15 de Fevereiro de 2008, ao plenário, beneficiando do debate realizado, uma versão definitiva daqueles três projectos, previamente divulgada pela lista TODOS.

    Por proposta do Núcleo do Porto foi também aprovado, no mesmo Plenário, a constituição de uma Comissão Instaladora responsável pela elaboração dos projectos supra referenciados.

    Esta Comissão é constituída por:
    - Ana Gaspar
    - Fernando Vicente
    - Jorge Martins
    - José Luís Villalobos Filipe
    - José Machado de Castro ( Núcleo do Porto)
    - Lúcia Ezaguy Simões
    - Manuel Macaísta Malheiros
    - Paula Cabeçadas
    - Raimundo Narciso

    quarta-feira, 31 de outubro de 2007

    IX Curso Livre de História Contemporânea - "História, Memória e Democracia - Portugal/Espanha"


    Sob o lema "História, Memória e Democracia - Portugal/Espanha" decorre entre 12 e 17 de Novembro de 2007 o IX Curso de História Contemporânea, organizado pelo Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Nova de Liboa e a Fundação Mário Soares.

    Do folheto da Organização, salientamos o propósito do tema deste ano: "O tema escolhido prende-se com o propósito dos organizadores abordarem a forma como, em ambos os países, onde o assunto é tão actual, é tratada a história da luta pela conquista da liberdade e da democracia e salvaguardada a sua memória, pelos poderes instituídos e pela sociedade civil."

    Programa:

    12 de Novembro - 2ª feira - 14.30 - Abertura do Curso
    Reitor da UNL
    Director da FCSH,
    Presidente da FMS
    Presidente do Instituto de História Contemporânea

    15.30 - Lição inaugural - Prof. Doutor Fernando Rosas - Director científico do Curso

    16.15 - Debate

    13 de Novembro - 3ª feira -Transição pactuada e Memória dos Vencidos em Espanha

    15.00 - Apresentações
    Prof.ª Carme Molinero - Universidade Autónoma de Barcelona
    Prof. Ismael Saz – Universidade de Valencia

    17.00 - Pausa

    17.10 - Prof. Julian Casanova – Universidade Saragoça

    17.50 - Comentador: Prof. Doutor Manuel Loff, F.L. Universidade do Porto

    18.30 - Debate

    14 de Novembro - 4ª feira - Memória e História da Ditadura no Portugal democrático

    15.00 - Apresentações
    Prof. Doutor Luís Reis Torgal – F. L. da Universidade Coimbra

    Prof. Doutor António Costa Pinto – Instituto de Ciências Sociais

    Dr. José Pacheco Pereira - ISCTE

    17.00 - Pausa

    17.10 - Comentador: Prof. Joseph Sanchez Cervelló – Universidade Rovira Y Virgil, Tarragona

    17.50 - Debate

    15 de Novembro - 5ª feira - Ditadura e Resistência – Os Arquivos da Memória

    15.00 - Mesa-Redonda
    Dr. Silvestre Lacerda – Director do IAN – Torre do Tombo
    Dr. José Ramón Cruz Mundet – Subdirector Geral de Arquivos de Espanha
    Dr. Alfredo Caldeira – Administrador do Arquivo & Biblioteca da Fundação Mário Soares
    Dra Natércia Coimbra - Centro de Documentação 25 de Abril, Universidade de Coimbra

    17.00 - Pausa

    17.10 - Comentador: Prof.ª Doutora Irene Pimentel (IHC /FCSH/UNL)

    17.30 - Debate

    16 de Novembro - 6ª feira - Memória da Resistência. Os testemunhos

    15.00 - Testemunhas
    Edmundo Pedro (“Não Apaguem a Memória”)
    Aurélio Santos (U.R.A.P.)
    Raul Morodo
    Santiago Carrillo
    Mário Soares

    17.30 - Debate

    17 de Novembro - Sábado

    10.00 - Mesa-redonda - Políticas para a Memória
    (Representantes das opiniões políticas com assento parlamentar – PS, PSD, PCP, PP e BE)

    11.40 - Debate

    12.40 - Encerramento do Curso Livre

    Lei da memória histórica foi aprovada em Espanha

    O parlamento espanhol aprovou hoje a Lei da memória histórica, em reconhecimento das vítimas do franquismo (em especial as da Guerra Civil de Espanha) e condenando esse regime como anti-democrático e usurpador do poder legítimo (vd. noticiário no diário espanhol Público). O respectivo anteprojecto fora aprovado em Julho passado, tal como então referimos neste post, em colaboração com o historiador Daniel Lanero Táboas.
    Do lado positivo, destacam-se 9 pontos: 1) a condenação do franquismo, enquanto regime usurpador do poder democrático legítimo e opressor do povo espanhol (de acordo com o aprovado pela Comisión Constitucional del Congreso, em 2002, e pelo Conselho da Europa, em 2006); 2) a valorização da memória pública das vítimas da Guerra Civil de Espanha que lutaram pela defesa dos valores democráticos; 3) a ilegitimidade dos julgamentos franquistas relativos à Guerra civil; 4) a retirada dos símbolos franquistas de monumentos públicos e das igrejas (salvo se atentarem contra a integridade artística religiosa desses espaços), sob pena de suspensão de subsídios oficiais a essas entidades; 5) a proibição de celebrações políticas no Vale dos Caídos; 6) a possibilildade de concessão de indemnizações às vítimas caídas em nome da defesa da democracia; 7) a integração do Archivo General de la Guerra Civil de Salamanca no novo Centro Documental de la Memoria Histórica, tb. sediado naquela cidade; 8) a posibilidade de concessão da nacionalidade espanhola aos descendentes até ao 1.º grau de quem perdeu a nacionalidade espanhola pelo exílio, em consequência da Guerra civil ou da ditadura franquista; 9) facilidade de localização das fossas comuns e de identificação das vítimas do franquismo pelas autoridades públicas.
    Do lado negativo, ressaltam 4 aspectos principais: 1) a não revisão dos processos judiciais franquistas ligados à Guerra civil; 2) as dificuldades na reabertura de fossas comuns de vítimas da repressão (os custos não são cobertos pelo Estado); 3) o futuro estatuto do monumento franquista Vale dos Caídos (que se mantém sem remoção da simbologia franquista); 4) o modo de se proceder à indemnização das vítimas.
    Para uma reflexão mais aprofundada sobre esta importante questão recomenda-se a leitura do post "A «Ley de la memoria histórica», por Daniel Lanero Táboas" e das notícias "Las diez claves de la nueva ley" e "El Congreso aprueba la Ley de Memoria Histórica", ambas do diário espanhol Público.
    Nb: imagem icónica do assassínio de defensor republicano durante a Guerra Civil de Espanha, vítima de disparos por fiéis aos nacionalistas de Franco (foto de Robert Capa).

    Petição anti-Museu Salazar com 16 mil assinaturas será entregue na AR a 5 de Novembro

    Uma petição contra o «Museu Salazar», organizada pela URAP, recolheu 16 mil assinaturas até 30 deste mês, informa hoje esta organização no seu site oficial.
    Este museu foi projectado para Santa Comba Dão, ao arrepio das deliberações camarárias, com prejuízo para o erário público e albergaria bens do ditador, fazendo prever um museu apologético (ou, no mínimo, nostálgico) do regime deposto.
    Após contestação pela opinião pública, o projectado «Museu Salazar» foi entretanto 'maquilhado' como «Centro Documental Museu e Parque Temático do Estado Novo», sem que tenham sido alterados os pressupostos iniciais.
    A petição será entregue pela URAP no Parlamento no próximo dia 5 de Novembro, às 16h.

    segunda-feira, 29 de outubro de 2007

    Encontros em lugares de Memória da Resistência - “Sem memória não há futuro”


    Dia 27 decorreu a 2ª sessão de Encontros em Lugares de Memória da Resistência organizada pelo núcleo do Porto do Não Apaguem a Memória!

    O jornalista Victor Melo do jornal 1º de Janeiro esteve presente e publicou o artigo que transquevemos:

    O Movimento Não Apaguem a Memória! promoveu um encontro no Café Ceuta para ouvir relatos de protagonistas da luta contra a ditadura. Histórias de sofrimento contadas na primeira pessoa, num dos locais onde a liberdade era respirada, clandestinamente.

    Sexta-feira, 24 de Março de 1967

    Um tiro cruza a estrada e rebenta um dos pneus do velho Mini Morris, arrastando o veículo e os seus quatro ocupantes por uma ribanceira de 30 metros. Após uma queda revoltosa, imobiliza-se, capotado e em chamas. Dois dos ocupantes conseguem sair e retirar um outro por uma das exíguas janelas do já por si exíguo automóvel. O quarto ocupante, preso por um dos bancos, morreu queimado.

    Jorge Pires recupera os sentidos deitado no alcatrão, com a visão de centenas de jornais a esvoaçar pela estrada. E foi precisamente com esses papéis e palavras proibidas a pairar à sua volta que seria algemado por dois agentes da PIDE, moribundo, ainda a ouvir os gritos de agonia do seu amigo a ser devorado pelas labaredas.

    Com 21 anos, estudante do segundo ano da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e acabado de aderir ao partido comunista, tinha arrancado do Porto com destino a Lisboa. O carro foi interceptado na estrada nacional em Arrifana, perto de Santa Maria da Feira. Na bagageira seguia uma mala com centenas de jornais do Avante. “Na altura eram jornais clandestinos, proibidos. Bastava ser apanhado com um na mão para ser interrogado ou até preso”. As publicações eram impressas em tipografias sombrias, clandestinas, secretas. “Quando impressos no norte, eram distribuídos no sul ou vice-versa”.

    O jovem estudante permaneceu hospitalizado durante quatro meses, sob ordem de prisão. “Era surreal, eu cheio de gesso dos pés à cabeça, a ser interrogado na enfermaria pelos agentes da PIDE, munidos de máquinas de escrever e ávidos por respostas”, recorda.

    Em fins de Novembro é enclausurado nos calabouços da PIDE no Porto. Ali permanece, sem direito a visitas, tratamento hospitalar, ler ou escrever. Isolado do mundo sem nada mais do que a companhia omnipresente da luz acesa. Todos os dias descia da “tarimba” e caminhava, passos sem fim num espaço de três metros por dois. “Percorria aquilo de trás para a frente”, contando as vezes que fazia essa “viagem”. “Era a única forma de combater o stress”.
    Recorda vividamente a espinha de bacalhau que lhe foi servida na cela na véspera de Natal, o balde dos dejectos, “as frias paredes de pedra, de branco sujo, com uma janela minúscula, gradeada, quase junto ao tecto”. Longe da vista, mas perto dos ouvidos. “Era angustiante. Ouvia o ruído dos carros, as pessoas a passarem na rua. Que dor era sentir o quotidiano das pessoas, indiferentes à minha presença naquela cela, à injustiça do meu cativeiro”.

    A reminiscência é de Jorge Pires, 62 anos, professor de Filosofia e Psicologia e membro da Assembleia Municipal de Torres Vedras. As suas palavras são ouvidas no Café Ceuta, “local de inúmeras conversas secretas até às tantas da manhã, sempre na mira dos bufos fascistas”, no âmbito da iniciativa «Encontros em lugares de Memória da Resistência», protagonizada pelo núcleo do Porto do movimento «Não Apaguem a Memória!». Trata-se de um movimento cívico que visa a preservação da memória histórica das lutas de resistência à ditadura, promovendo encontros em lugares emblemáticos dessa resistência.