domingo, 17 de dezembro de 2006

À morte de um canalha

Os canalhas vivem muito,
mas algum dia morrem

OBITUÁRIO COM 'HIP-URRAS'

Vamos festejá-lo
venham todos
os inocentes
os lesados
os que gritam à noite
os que sonham de dia
os que sofrem no corpo
os que alojam fantasmas
os que pisam descalços
os que blasfemam e ardem
os pobres congelados
os que amam alguém
os que nunca se esquecem
vamos festejá-lo
venham todos o crápula morreu
acabou-se a alma negr
o ladrão
o suíno
acabou-se para sempre
'hip-hurra'
que venham todos vamos festejá-lo
e não-dizer
a morte
sempre apaga tudo
a tudo purifica
qualquer dia
a morte
não apaga nada
ficam
sempre as cicatrizes
'hip-hurra'
morreu o cretino
vamos festejá-lo
e não-chorar por vício
que chorem seus iguais
e que engulam suas lágrimas
acabou-se o monstro prócere
acabou-se para sempre
vamos festejá-lo
a não-ficarmos tíbios
a não-acreditar que este
é um morto qualquer
vamos festejá-lo
e não-ficarmos frouxos
e não-esquecer que este
é um morto de merda

Mario Benedetti, poeta uruguaio, nasceu em 1920 e fez este poema às 4h da madrugada do dia em que soube que Ronal Reagan morreu. O Movimento "Não Apaguem a Memória!" considera que ele foi feito por medida para o ditador Pinochet, que a morte levou, muito atrasada, no passado 11 de Dezembro.

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